Por Esly Regina de Carvalho
Uma das consequências menos conhecida ou quem sabe é melhor dizer, reconhecida dos traumas é que limita a nossa capacidade para a aprendizagem: fica bloqueada. Gente traumatizada não consegue aprender direito. Não tem espaço cerebral e emocional para isso. Estão muito preocupados em poder sobreviver emocionalmente às coisas que lhe aconteceram. E isso não acontece apenas com os “traumas grandes” que todo mundo admite que é complicado, tal como, os sequestros, acidentes, mortes, e assaltos. Há o que que chamo de “trauma light” que também afeta a capacidade de aprender e marca as pessoas.
É muito comum receber pacientes que se dizem burros e que relatam que nunca foram bem na escola. Quando eu pergunto como era sua vida naquela época me contam uma longa história de humilhações escolares, ou os pais se separaram; havia falta de apoio e amparo, e assim por diante. Eu explico que quem tem este nível de “barulho interno” não tem espaço para aprender. O problema não foi que lhes faltou inteligência. O que fez falta foi a possibilidade de poder ouvir a lição externa porque o ruído interno estava muito alto. Quando curamos o barulho interno, abrimos espaço para uma real aprendizagem. As lembranças difíceis estavam ocupando o espaço da álgebra.
Também me pergunto quanto do que se diagnostica atualmente como déficit de atenção, especialmente em crianças, é realmente isso. A ansiedade na infância devido a situações que crianças não estão conseguindo manejar cria um quadro muito parecido ao de déficit de atenção. Quem pode prestar atenção na professora quando está tentando lidar com o bullying dos colegas?
A notícia boa é que atualmente existe uma nova terapia chamada EMDR pelas siglas em inglês (Eye Movement Desensitization and Reprocessing) que significa Dessensibilização e Reprocessamento por meio de Movimentos Oculares. Reconhecida pela Organização Mundial de Saúde como cientificamente comprovada para tratar traumas, é sumamente efetiva também para tratar questões de ansiedade, que muitas vezes formam a base dos traumas. O tratamento infantil é especialmente eficaz porque as crianças tem uma quantidade de lembranças menores que os adultos e costuma responder mais rapidamente ao tratamento. Permite também tratar crianças muito pequenas, até com poucos meses de idade.
Ao resolver as raízes das lembranças alojadas nas redes de informação neuroquímica, resolve também as condutas subsequentes, já que são essas lembranças mal processadas que servem de base para o comportamento inadequado. É muito bom saber que a psicoterapia hoje oferece um novo paradigma de tratamento, rápido, cientifico e eficaz. Agora todo mundo pode aprender matemática! Pelo menos se depende de resolver o barulho interno. Falando sério: se a causa da dificuldade for traumática, a terapia EMDR pode ajudar a desbloquear a capacidade de aprendizagem, e libertar a pessoa para uma nova oportunidade na vida.
Imagem de capa: Shutterstock/chairoij
Mais sobre o trabalho da autora na TraumaClinic do Brasil